Texto a ser analisado ampliou faixa de renda com algum tipo de benefício para R$ 7.350 mensais. Emendas ainda podem alterar pontos da proposta
Deve ser votado nesta quarta-feira (1º), na Câmara dos Deputados, o projeto que zera o Imposto de Renda (IR) para quem ganha até R$ 5 mil, alivia alíquotas de outras faixas de rendimento médio e impõe cobrança mínima sobre ganhos além de R$ 50 mil mensais — incluindo dividendos, até então isentos.
O texto do Projeto de Lei 1087/25, estruturado pelo governo federal, será levado ao plenário com alguns ajustes feitos pelo relator da proposta na Câmara, o deputado federal Arthur Lira (PP-AL). Um dos mais importantes é a elevação do limite máximo de renda para usufruir de algum nível de benefício — o corte vai dos R$ 7 mil previstos inicialmente pelo Ministério da Fazenda para R$ 7.350. O possível impacto da reforma, porém, ainda depende da apreciação de pelo menos 50 emendas já apresentadas por parlamentares que podem alterar diferentes pontos da versão atual.
O projeto que será avaliado pelos deputados se assemelha a outro aprovado na semana passada pela Comissão de Assuntos Econômicos do Senado. Conforme o relator dessa segunda iniciativa, o senador Renan Calheiros (MDB-AL), a decisão de apreciar um texto alternativo àquele construído pelo Planalto foi motivada pela “demora” da Câmara em votar a matéria — morosidade que deve terminar nesta quarta. Dessa forma, passa a ganhar prioridade o documento assinado por Lira.
Conforme o advogado tributarista Edmundo Eichenberg, do escritório Eichenberg, Lobato, Abreu Advogados Associados, quem tem rendimento de R$ 5 mil contaria com um alívio de R$ 312,89 ao mês, parcela que o Leão deixaria de abocanhar. Ao longo de um ano, considerando ainda o 13º salário, isso resultaria em pouco mais de R$ 4 mil que permaneceriam no bolso do contribuinte.
Eichenberg avalia como positiva a medida de ampliar a faixa de isenção:
— Em termos de desoneração, com certeza é positivo. Gera uma correção da tabela progressiva e compensa ao menos uma parte da defasagem acumulada ao longo do tempo. Traz para a realidade atual uma isenção que já tivemos no passado, com valor atualizado.
Mas Eichenberg entende que o projeto também apresenta problemas ao criar dois regimes diferenciados de tributação — já que os contribuintes com renda mensal acima do limite previsto de R$ 7.350 seguiriam pagando o imposto com base na tabela convencional do IR, com alíquotas que variam de 7,5% a 27,5% para diferentes faixas de rendimento.
— A principal crítica é que a reforma não atinge demais faixas acima desse valor. Acaba criando o que se tenta evitar, que é um salto grande entre quem ganha até R$ 7.350 e quem ganha R$ 1 acima disso e fica sujeito a um regime bem mais pesado de tributação — complementa Eichenberg.
Se eu não corrijo toda a tabela, acabo criando essa distância entre quem ficou R$ 1 abaixo ou acima do limite.
EDMUNDO EICHENBERG
Advogado tributarista
Outro ponto fundamental da proposta a ser votada hoje é a imposição de um “imposto mínimo” para quem recebe acima de R$ 600 mil ao ano (ou mais de R$ 50 mil mensais). Nesse caso, a alíquota passa a ser progressiva, chegando a 10% no caso de rendimentos superiores a R$ 1,2 milhão anuais. Essa é uma medida, segundo o governo, destinada a promover justiça fiscal, além de ajudar a compensar as isenções de quem ganha menos. Também passaria a ser cobrado IR sobre dividendos, isentos desde os anos 1990, acima dos R$ 50 mil mensais.
O advogado tributarista Rafael Pandolfo, do escritório que leva seu nome, avalia que a taxação das faixas de renda mais elevadas é o ponto mais sensível do projeto:
— Grandes empresas podem deixar o lucro acumulado e não distribuí-lo. Não seriam impactadas. Nas sociedades de profissionais, como médicos, dentistas e contadores, os sócios vivem da distribuição de dividendos. (…) A carga total de tributação sobre a renda dessas sociedades é de 34%, porque ainda recolhem contribuição social sobre o lucro de 9% (…). A isenção dos dividendos foi instituída justamente quando foi criado o adicional de imposto de renda das empresas que auferem mais lucros — avalia Pandolfo.
O projeto mantém o pior dos dois mundos: adicional na pessoa física e na pessoa jurídica. Essa tributação estimulará a sonegação e a informalidade.
RAFAEL PANDOLFO
Advogado tributarista
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, defende a taxação dos mais ricos.
— A alíquota efetiva média de quem ganha mais de R$ 1 milhão por ano é 2,5%. Tem alguma coisa errada com o Brasil. Tem alguma coisa muito errada com esse país — afirmou o ministro, em junho, durante audiência na Câmara.
Se for aprovado, o projeto segue para análise do Senado.
O projeto já previa cerca de 10 milhões a mais de contribuintes isentos, a partir da alíquota zero para quem recebe até R$ 5 mil. A faixa de desconto variável acima de R$ 5 mil até R$ 7.350 beneficia outros seis milhões de pessoas, totalizando cerca de 16 milhões de contribuintes beneficiados de alguma forma.
Conforme o governo federal, seriam 141,4 mil contribuintes, cerca de 0,13% do total, ou cerca de 0,06% da população brasileira. Esse grupo é formado por quem recebe mais de R$ 600 mil por ano.
O imposto mínimo considera o que já foi pago. Se um contribuinte com R$ 1,2 milhão anuais pagou 8% de IR, terá que pagar apenas mais 2% para atingir os 10%. Se um contribuinte com R$ 2 milhões já pagou 12% de IR, não pagará nada a mais. Em relação aos dividendos, o projeto traz um mecanismo que impede que a tributação conjunta da pessoa jurídica e da pessoa física seja superior a 34%.