Um ano depois, 66 pessoas ainda estão presas pelos atos antidemocráticos em Brasília - Agora Já -

Um ano depois, 66 pessoas ainda estão presas pelos atos antidemocráticos em Brasília



No início de 2023, cerca de 1,3 mil acabaram detidos acusados de diversos crimes, como tentativa de golpe de Estado

Foto: Dia foi marcado por vandalismo e destruição nos prédios dos poderes Sergio Lima / AFP
5 de janeiro de 2024

A tarde ensolarada e quente de 8 de janeiro de 2023 explodiu em fúria quando milhares de manifestantes, transportados em cerca de cem ônibus, tomaram a Praça dos Três Poderes, coração de Brasília. Parecia ser mais um dos tantos protestos contra a eleição de Luiz Inácio Lula da Silva, que completava oito dias na Presidência da República.

Não. Era muito mais do que isso. Os ativistas de extrema direita queriam impedir, à força, a continuidade do governo.

Por volta das 15h, os extremistas, a maioria ornamentada com símbolos em verde e amarelo, cruzaram os gramados, ultrapassaram cordões de isolamento, avançaram sobre atônitos guardas palacianos e ingressaram nos principais prédios públicos do país: o Palácio do Planalto, o Congresso e o Supremo Tribunal Federal (STF). Em um efeito manada, centenas de vândalos quebraram tudo o que encontraram pela frente: vidraças, mobílias, quadros, microfones, aparelhos de som. Alguns defecaram sobre os móveis usados por ministros e parlamentares.

A reação demorou, mas veio. Policiais militares, agentes federais e militares do Exército fizeram um cerco e começaram a prender os autores do badernaço. A retomada do controle dos prédios levou horas, mas resultou na detenção de 1,9 mil pessoas.

Dessas, algumas centenas acabaram liberadas por serem idosos ou terem problemas de saúde. E 1,3 mil foram presos em flagrante. Passado um ano, 66 deles continuam presos. E todos os detidos naquele momento seguem na mira da Justiça.

As prisões resultaram em indiciamentos e mais de duas centenas de envolvidos respondem hoje a processos judiciais que podem lhes render mais de 20 anos de reclusão. São os acusados de tentativa de golpe de Estado.

Os demais detidos, mais de mil, terão opção de tentar evitar o processo, desde que demonstrem publicamente arrependimento e jurem não se envolver mais em atos de extremismo político.

O balanço do 8/1

Ataque e planejamento

Investigações da Polícia Federal (PF) e do Ministério Público Federal (MPF) concluíram que o 8 de Janeiro foi cuidadosamente arquitetado para gerar o caos em Brasília e estimular as Forças Armadas a darem um golpe de Estado, para “restaurar a ordem”. Isso aconteceria com a remoção de Lula da Presidência e a prisão de ministros do STF, como pediam os manifestantes mais exaltados.

Houve falhas de segurança, tanto na prevenção como na repressão ao badernaço. Excursões chegaram a Brasília saídas de vários Estados, sem serem abordadas para vistoria policial. Manifestantes foram recebidos com refeições, em acampamentos montados em frente a quartéis das Forças Armadas. Autoridades subestimaram o tamanho dos protestos anunciados.

Codinomes e senhas (como “Festa da Selma”) foram usados pelos manifestantes para organizar a investida aos prédios públicos. Com base em relatórios das polícias Militar e Legislativa, o MPF ressalta que a invasão das sedes dos três poderes foi montada em linhas de ataque.

Alguns grupos atuavam na linha de frente, munidos de armas improvisadas (como machados e pedaços de pau). Outros agiam na retaguarda, dando suporte e abrindo extintores de incêndio para dificultar a atuação dos policiais. A constatação dos promotores vai na contramão do que alegam os manifestantes presos, que dizem ter ido a Brasília sem qualquer objetivo de invasão.

Um dos investigados a respeito do episódio é o ex-presidente Jair Bolsonaro.
No inquérito sobre atos antidemocráticos aberto por determinação do STF, procuradores da República checam possível incitação de Bolsonaro aos atos.

Presos e processados

Entre os dias 8 e 9 de janeiro de 2023, 1.927 pessoas foram detidas por envolvimento em bloqueios de ruas, associação para o crime e depredações em Brasília. Elas estavam divididas em dois grupos, basicamente: 243, que foram presos em flagrante após invadirem sedes dos três poderes (161 homens e 82 mulheres), e os demais 1.684, por estarem acampados ou bloqueando vias públicas próximas a quartéis das Forças Armadas.

Dos 1,9 mil detidos, 775 foram liberados ainda em 9 de janeiro, por serem idosos ou apresentarem problema de saúde. Os demais ficaram presos por algum tempo.

Ao longo do ano, o STF concedeu liberdade vigiada à maioria dos presos. Eles deixaram os presídios “mediante a imposição de medidas cautelares diversas”. A mais comum, o uso de tornozeleira eletrônica. Eles também estão proibidos de se manifestar nas redes sociais.

Passado um ano, 66 pessoas envolvidas nos distúrbios continuam em presídios, conforme o STF. Desses, 33 foram capturados em flagrante pela invasão de prédios públicos naquele dia.

Os demais tiveram prisões preventivas decretadas ao longo dos últimos meses, após investigações da Operação Lesa Pátria (da PF), que os apontaram como instigadores, financiadores ou executores da tentativa de golpe de Estado. Dos 66 presos, oito estão condenados.

As condenações também atingem alguns dos que foram liberados ao longo do ano.
Os julgamentos começaram no segundo semestre de 2023 e até agora 30 pessoas foram condenadas (desses, apenas oito estão presos, os demais aguardam em liberdade julgamento de recursos contra as sentenças). As penas variam de 13 a 17 anos de prisão. Nenhum dos julgados foi absolvido.

Entre os condenados, estão três pessoas nascidas no RS. Só um deles, no entanto, é morador do Estado: o santa-mariense Eduardo Zeferino Englert, estudante de Psicologia e microempresário. Ele aguarda em liberdade recurso contra a sentença, de 17 anos de prisão.

Morte e doenças na prisão

Uma das polêmicas é a situação de alguns presos que apresentam doenças crônicas. Um deles, o empresário baiano Cleriston Pereira da Cunha, 45 anos, morreu de mal súbito. Ele tinha comorbidades decorrentes da covid-19.

Outros têm pedido de libertação, alegando doenças. É o caso do agricultor gaúcho Jorginho Cardoso de Azevedo, de 63 anos, que mora no Paraná, preso em flagrante após invadir o Palácio do Planalto.

Ele também fretou ônibus, por R$ 28 mil, para levar manifestantes que acabaram invadindo prédios. Azevedo está encarcerado desde 8 de janeiro na Penitenciária da Papuda e doente. Teve diagnosticada depressão e alega fortes dores, por ter oito pinos metálicos na coluna vertebral.

A oposição pressionou para que os doentes sejam libertados e os condenados, perdoados, mas o indulto natalino, assinado por Lula, não beneficiou sentenciados pela tentativa de golpe em 8 de janeiro.

Prejuízo milionário

Os prejuízos materiais são contabilizados em R$ 25,6 milhões: R$ 4,6 milhões no Planalto, R$ 4 milhões no Senado, R$ 5 milhões na Câmara e, na sede do STF, que foi o prédio mais atingido, as avarias são estimadas em R$ 12 milhões.

No Congresso, os denunciados quebraram vidros, móveis, lixeiras, computadores, totens informativos, obras de arte, pórticos, câmeras de circuito fechado de TV, equipamentos de segurança e veículos. Acessaram e depredaram espaços da Chapelaria, do Salão Negro, das cúpulas e do museu. Danificaram móveis históricos e queimaram o tapete do Salão Verde da Câmara, empregando substância inflamável.

No STF, 951 itens foram furtados, quebrados ou completamente destruídos. Entre o material depredado, estão quatro fotografias de Sebastião Salgado (R$ 784 mil) e 10 câmeras de vídeo da TV Justiça (R$ 2 milhões).

Fonte : GZH 
Foto : Sergio Lima / AFP

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