Advogados são suspeitos de lesar aposentados e servidores ao contratar empréstimos fraudulentos - Agora Já -

Advogados são suspeitos de lesar aposentados e servidores ao contratar empréstimos fraudulentos



Polícia Civil cumpriu 74 ordens judiciais e estima que número de vítimas pode chegar a 10 mil

Foto: Operação tem como alvo 14 pessoas, sendo nove advogados. Ronaldo Bernardi / Agencia RBS
8 de maio de 2025

A Polícia Civil deflagrou na manhã desta quinta-feira (8) a Operação Malus Doctor, que investiga um grupo de advogados suspeito de fraudar procurações judiciais para contratar empréstimos em nome de clientes e lesar instituições financeiras com processos fraudulentos. Estima-se que o grupo teria movimentado R$ 50 milhões e lesado mais de 10 mil pessoas com o esquema.

Policiais da 2º Delegacia de Polícia de Porto Alegre cumpriram 74 mandados judiciais, sendo 35 de busca e apreensão, em Porto Alegre e Glorinha, na Região Metropolitana, e Xangri-lá, no Litoral Norte. Dos 14 alvos, nove são advogados e têm ordens de suspensão do exercício da advocacia em seus nomes. Todos os alvos da operação tiveram contas bancárias bloqueadas, informou a polícia.

O escritório investigado é Daniel Nardon Advogados Associados, com sede no Centro Histórico de Porto Alegre. Contatado pela reportagem, o advogado que representa Daniel Nardon, Ricardo Breier, disse que ainda está se inteirando dos fatos.

— Como é um crime de estelionato, crime sem violência, costuma não ser dado (o mandado de) prisão. Ele não foi localizado aqui (em Porto Alegre), ele está no Estado de São Paulo e estamos em contato para ele vir aqui — explica o delegado Vinícius Nahan, responsável pela investigação.

Nahan conta que os alvos do grupo eram clientes que buscavam renegociar juros que impostos sobre empréstimos junto a instituições financeiras. Com os dados destas pessoas, os advogados teriam contraído novos empréstimos sem o consentimento das vítimas e ajuizado ações revisionais contra os bancos.

Conforme a Polícia Civil, o escritório teria registrado mais de 145 mil ações judiciais “potencialmente fraudulentas”, sendo 112 mil no Rio Grande do Sul e mais de 30 mil em São Paulo. O principal alvo da investigação seria responsável por 47% de todas as ações contra instituições financeiras registradas no Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) e o quinto maior litigante na mesma corte.

— O escritório acabava ficando tanto com o valor do processo judicial quanto com a parte deste novo empréstimo — afirma Nahan.

A esposa e a cunhada de Nardon foram detidas com munições de uso restrito e R$ 16 mil em espécie. Ainda não há confirmação sobre a participação delas no esquema, segundo o delegado. Durante depoimento na delegacia, a polícia decidiu por decretar a prisão em flagrante da esposa de Nardon por porte de munição de uso restrito.

Como funcionava o esquema

Segundo a Polícia Civil, após ajuizar processos revisionais contra as instituições financeiras, o grupo contratava um empréstimo em nome dos clientes e o valor entrava na conta deles. As vítimas acreditavam que a quantia era uma indenização por conta da ação judicial.

O grupo então cobrava honorários de 30% sobre o montante do empréstimo. Posteriormente, o escritório também se apropriava do valor referente ao processo ajuizado sem o conhecimento do cliente.

— Eles (advogados) ajuizavam ações sem as pessoas saberem. As vítimas são aposentados, servidores públicos, professores estaduais e policiais militares, porque esse escritório acaba fazendo a captação junto à associações de professores e de policiais militares. Além de não repassar o dinheiro para os clientes, as pessoas acabam também não sabendo que têm uma ação no nome dela — ressalta o delegado.

Nahan conta que o principal alvo da investigação criou duas associações, uma de defesa dos consumidores e outra voltada a defesa dos servidores públicos do Rio Grande do Sul. Ambas as entidades atuavam na captação de clientes, que viriam a se tornar vítimas do grupo, com a oferta de reduzir a taxa de juros em empréstimos.

— A presidente dessas associações é a irmã dele. E aí, essas associações entravam em contato com as pessoas que tinham empréstimos em seus nomes — conta Nahan, que ainda explica que essas associações têm legitimidade para solicitar informações de devedores junto a órgãos oficiais.

O delegado aponta que as instituições financeiras também são vítimas do esquema, assim como os clientes do escritório.

Procurações em branco

Segundo Nahan, as vítimas eram induzidas pelas associações a assinar procurações em branco, pensando que eram documentos para abrir um processo contra a instituição financeira em que tinham um empréstimo.

— (A vítima) achava que estava assinando uma procuração para entrar com o processo, mas ela deu poderes para a associação contrair empréstimo em seu nome. Em 30 dias, esse valor chegava na conta bancária, a associação entrava em contato novamente e dizia: “Viu, o processo já foi ganho, nosso escritório é eficiente e a nossa comissão é 30%, então pode depositar” — prossegue o delegado.

Mais de 10 mil vítimas

As investigações tiveram início há cerca de nove meses, após o judiciário identificar inconsistências em algumas ações ajuizadas pelo principal suspeito da Operação Malus Doctor.

— Algumas ações eram ajuizadas em nome de pessoas que já tinham falecido. Com o mesmo comprovante de residência, só mudava o nome do autor da ação, diversas ações ajuizadas em várias cidades. A pessoa morava em Porto Alegre mas o comprovante de residência era adulterado para várias cidades. Uma pessoa chegava a ter 30 ações no mesmo objeto, do mesmo empréstimo — relata o delegado.

Os casos causaram estranheza ao Judiciário, que solicitou investigação ao Ministério Público. A Federação Brasileira de Bancos (Febraban) também notificou a Polícia Civil, após cinco instituições financeiras registrarem ocorrências.

Até o momento, 50 vítimas do esquema já foram identificadas. No entanto, a estimativa é que sejam, ao menos, 10 mil casos.

— Fizemos uma estimativa de que, dos 100 mil processos, cerca de 10% sejam fraudulentos. Isso dá um montante de 10 mil vítimas, por isso estamos orientando a procurarem a Polícia Civil — alerta Nahan.

A investigação aponta que o esquema foi consolidado a partir de 2022. O escritório de Nardon chegou a ajuizar 580 processos contra instituições financeiras em um único dia, revela Nahan.

Nota do advogado de Daniel Nardon

Contatado pela reportagem, o advogado que representa Daniel Nardon, Ricardo Breier, disse que ainda está se inteirando dos fatos.

Confira a nota:

“O escritório Breier & Advogados informa que está atuando na defesa do advogado Daniel Nardon, no âmbito da Operação Malus Doctor, deflagrada pela Polícia Civil do Rio Grande do Sul na manhã desta quinta-feira, 8 de maio.

Esclarecemos que, até o presente momento, a defesa não teve acesso aos autos da referida operação. Tão logo isso ocorra, serão adotadas as medidas jurídicas cabíveis.

Reiteramos o compromisso com o devido processo legal, o contraditório e a ampla defesa, pilares do Estado Democrático de Direito, bem como a presunção de inocência, que deve ser plenamente assegurada a todo cidadão”.

Fonte : GZH 
Foto : Ronaldo Bernardi / Agencia RBS

 


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