Em 16 dias, evento que exalta a cultura do Rio Grande do Sul recebeu mais de 2 milhões de visitantes, maior número em 42 edições
Depois do desfile temático, na sexta-feira, feriado de 20 de Setembro, o sol voltou a brilhar e favoreceu a presença do público no final de semana de encerramento de um Acampamento Farroupilha repleto de novidades e desafios.
No domingo (22), com a temperatura rondando os 30ºC em Porto Alegre, as pessoas que deixaram para última hora compareceram em peso para conferir de perto as atrações do evento que, desde o dia 7, recebeu mais de 2 milhões de visitantes nas dependências do Parque Maurício Sirotsky Sobrinho, na Capital.
O recorde de público se soma a outros números contabilizados pela Gam3 Parks, concessionária do espaço que, nos últimos 16 dias, se tornou a casa de 187 piquetes, onde foram assadas mais de 400 toneladas de carne. Como nem só de churrasco se mede o sucesso da 42ª edição, após a enchente de maio, a cultura foi um dos pontos altos da festa dos gaúchos.
Do charque ao chip, o garoto autista Arthur, sete anos, se impressionou e interagiu de dentro do seu espectro com as peças da culinária típica que remetem à formação econômica do Estado e motivaram a revolução em 1835, mas também com um robô exposto em uma das empresas participantes do Pavilhão Farroupilha.
O pai, Valdecir Wartha, conta que a primeira visitação ficou para o domingo. O motivo: unir um passeio em família com as atrações do acampamento.
— O guri está curtindo. Ele se apega a tudo e se detém aos detalhes que o despertam. Ele gostou do cachorro mecânico, mas também ficou na frente da dupla que estava declamando. Ele gosta de gaita, só que o barulho às vezes incomoda um pouco, mas gosta muito da música gaúcha. É bem bacana — comenta.
E música não faltou, seja para o pequeno Arthur, ou para as 2 mil pessoas que, no sábado (21), lotaram os palcos Antônio Augusto Fagundes e Jayme Caetano Braun. Este ano, foram mais de 120 horas de música ao vivo.
Pela primeira vez, também puderam ser ouvidas 30 vozes de artistas mulheres, um recorde de participação feminina, celebrado pela secretária municipal da Cultura, Liliana Cardoso, com os olhos marejados em lágrimas.
E não é para menos, já que antes de assumir o cargo, a atual titular da pasta municipal da Cultura presidiu por três anos a realização do acampamento, local no qual a primeira mulher negra a ser eleita patrona dos festejos declamava há 40 anos os seus primeiros versos, subindo em mesas, ainda criança, acompanhada pelo pai, um dos integrantes do CTG Coxilha Aberta, do bairro Rubem Berta.
— Estar na condição de secretária me faz perceber algo que eu não enxergava desde a minha tenra infância: as mulheres cantando no palco. Vinda da periferia, eu só queria o palco, que era a oportunidade de mostrar o meu trabalho. É gratificante ver as novas Lilianas nessas comunidades, aquelas meninas jovens negras ali, pilchadinhas, sabendo que elas também podem — emociona-se, ao lembrar que, neste ano, a cultura missioneira esteve presente nos quatro cantos do parque.
Isso acontece porque o tema escolhido em 2024 foi o pajador de São Luiz Gonzaga Jayme Caetano Braun. Do mesmo rincão do Estado vem o homenageado desta edição, Pedro Ortaça.
— Meu velho galpão de estância, da pampa verde amarela, que ficou de sentinela, da história da nossa infância, és um marco na distância da velha capitania, porque foste a sacristia do batismo do gaúcho, quando moldou-se o debucho da pátria que amanhecia. Quinchado de santa fé, oito esteios, pau a pique, até parece um cacique, todo emplumado de pé. O legendário Sepé, o legítimo rei do trono — declama Liliana, de pronto, as rimas do pajador, enquanto lembra a dificuldade de pôr em pé o acampamento após a enchente.
Um dos exemplos da presença da obra de Jayme Caetano era encontrado logo em um dos acessos ao parque. Lá o Piquete Raiz Missioneira, do qual faz parte Irete Engler, trazia já na fachada, assim como há 10 anos, plantas e ervas medicinais exaltadas pelas rimas do poeta.
Dentro do espaço, que prima pela acessibilidade, os cartazes com pajadas traduzidas em libras garantiram ao espaço a nota 10 concedida pelos avaliadores do evento na 42ª edição.
— Desde o primeiro ano sempre montamos a hortinha, alguma coisa de chá e temperos. E este ano encaixou super bem no tema — afirma Irete ao comentar sobre as funções de plantas como o alecrim, o gerânio, a hortelã, entre outras.
Em 2024, o acampamento de Porto Alegre teve a estreia do pavilhão da agricultura familiar. Um sucesso de público e vendas, aprovado em ambos os lados do balcão.
Foram 40 estandes com produtos típicos, alguns inusitados, produzidos em 32 municípios do Rio Grande do Sul.
A SorveTchê, por exemplo, entre os oito sabores disponíveis, teve opções características do Estado. É caso da erva-mate e do butiá, esse esgotado já no sábado, campeão de vendas com mais de 230 litros comercializados desde o dia 7 por Obirajara Almeida.
Algumas bancas adiante, os blends de chás e geleias de flores oferecidos pela Produtos Lilien, de Picada Café, fizeram sucesso entre os visitantes, assim como o primeiro drip de chás do Brasil, garante Clarice Rohr, ao comentar que o carro-chefe em vendas é a geleia de bergamota com capim-limão.
Contrariando o dito popular que indica que “a rapadura é doce, mas não é mole”, Alexandre Ares garante que o produto fabricado pela Colonial Gelinger é uma “rapa mole”.
Lá, os sabores tradicionais de amendoim e melado convivem com opões que utilizam o leite em pó e caem no gosto de quem os prova.
— Vendi mais do que na Expointer — comemora o agricultor familiar de Parobé, tendo o sabor e a textura atestado pelo paladar do cliente Ernani Fonseca, que visitou o parque para conferir de perto as atrações da agricultura familiar gaúcha.
No pavilhão vizinho, o dos produtos artesanais, onde segundo os organizadores as vendas também foram recorde, Ezequiel Leite, da AlegraTchê, celebra a venda de 2 mil bombachas femininas em “uma das melhores semanas farroupilhas em 10 anos”, afirma. Na segunda participação, Gabriel da Costa Dias, da Cachaçaria Tradição da Iha, diz ter aumentado em 150% as vendas na comparação com o ano passado. Foram 700 garrafas em 16 dias: